Agarro a madrugada Como se fosse uma criança, Uma roseira entrelaçada, Uma videira de esperança, Tal qual o corpo da cidade Que manhão cedo ensaia a dança De quem, por força da vontade, De trabalhar nunca se cansa. Vou pela rua desta lua Que no meu Tejo acendo o cio, vou para Lisboa, maré nua Que desagua no Rossio. Eu sou um homem na cidade Que manhã cedo acorda e canta, E, por amar a liberdade, com a cidade se levanta. Vou pela estrada deslumbrada Da lua cheia de Lisboa Até que a lua apaixonada Cresce na vela da canoa. Sou a gaivota que derrota Todo o mau tempo no mar alto. Eu sou o homem que transporta A maré povo em sobressalto. E quando agarro a madrugada, Colho a mão como uma flor À beira mágoa desfolhada Um malmequer azul na cor, Um malmequer da liberdade Que bem me quer como ninguém, O malmequer desta cidade Que me quer bem, que me quer bem, Nas minhas mãos a madrugada Abriu a flor de Abril também, A flor sem medo perfumada Com o aroma que o mar tem, Flor de Lisboa bem amada Que mal me quis, me quer bem.
José Carlos Ary dos Santos